Hoje vou dar continuidade a um projeto que venho retomando a longos intervalos. Em janeiro de 2009 publiquei neste blog o texto Areias invasoras, no qual fiz elogios e críticas ao primeiro volume da série Um judeu marginal: repensando o Jesus histórico, de J. P. Meier. No mesmo dia, meu amigo André Luiz fez um interessante comentário, ao qual dei uma resposta parcial um bom tempo depois, há pouco mais de um ano, no texto Esterilidade consensual. Ali busquei absorver a contribuição de meu amigo e formular de outra maneira o que julgo ser o problema fundamental da abordagem de Meier: a ostentação de uma imparcialidade impraticada e impraticável que resulta apenas na exclusão das posturas historiográficas inspiradas em teologias conservadoras, rejeitadas de antemão como antiacadêmicas. Trata-se, em resumo, de uma parcialidade exercida em nome da imparcialidade. Contudo, eu não disse tudo o que vale a pena dizer sobre as considerações do André Luiz, de modo que pretendo agora dar continuidade ao meu comentário, a despeito do longo tempo decorrido.
Para que ninguém seja obrigado a ler ou reler meu texto original, embora isso seja recomendável, aqui vão algumas palavras acerca dele. O texto tem uma estrutura bem definida: feita a introdução ao assunto, destaquei as qualidades do autor e listei os principais méritos da obra. Depois disso, fiz-lhe várias críticas, começando pelo menos importante e progredindo em direção ao realmente importante. O fio comum a toda a crítica é a incoerência do autor. Os erros menos importantes residem na incoerência entre seus pressupostos e algumas de suas conclusões; os de importância intermediária, na incoerência interna dos próprios pressupostos; e os mais importantes estão na completa ausência de argumentação sobre pontos essenciais à validade de todo o empreendimento. Em todos os casos, citei alguns exemplos concretos que me pareceram deveras reveladores, mas o fiz em diferentes etapas do texto, a fim de deixar claro que não tencionava colocar todos esses erros no mesmo patamar.
Passei do elogio à crítica com as seguintes palavras: "Vejo também, entretanto, muito espaço para críticas, tanto a pontos específicos quanto à estrutura global e às próprias motivações da obra. O autor não deixa de cair na cilada do ceticismo excessivo em certos pontos, como ao negar a realidade histórica das narrativas sobre a infância de Cristo ou ao defender que o relato da concepção virginal de Jesus Cristo é fruto de uma tradição posterior, que não poderia de modo algum ter origem na própria mãe do Salvador." Acerca desse trecho, o André teceu o seguinte comentário:
"Rapaz, não é que ele caia em uma armadilha. Ele é, na maior parte do tempo, consistente com o melhor método histórico. Mas é esse método que sempre vai implicar uma distância, maior ou menor, entre uma biografia secular de Jesus e o que dizem os Evangelhos. A tentativa mesma de se procurar um 'Jesus Histórico' à parte do Cristo da Tradição implica em se criar outra história distinta da tradicional. Nesse sentido, Meier está correto: O Jesus Histórico jamais será o Jesus Real, pois o Jesus Histórico é construído por meio de uma disciplina racionalista, com métodos analítico-críticos, pressupostos metodológicos naturalistas etc. E neste sentido Bultmann está correto. Está correto porque 'se você parte dos princípios errados, sua conclusão também será errada', como disse Chesterton (cito de cabeça)."
Há várias questões interessantes aqui. A primeira decorre do que eu disse acima. Os exemplos que citei nesse trecho como reveladores de um "ceticismo excessivo", sendo os primeiros do post, pertencem à classe das conclusões que são discutíveis mesmo dentro do conjunto de pressupostos adotados por Meier. Não pretendo registrar agora as razões que me levaram a emitir tal juízo, inclusive porque li o livro há mais de dois anos e não o tenho em mãos, o que poderia me levar a cometer alguma imprecisão ou injustiça. Desejo, no momento, apenas esclarecer isto: ao dizer que Meier foi cético demais em seus juízos sobre a historicidade das narrativas da infância e da concepção virginal, sobretudo desta última, eu não estava me distanciando dos pressupostos do autor, e sim adotando-os para fins de argumentação. Com relação à concepção virginal, em especial, foi isso mesmo que eu disse na frase subsequente: "Aliás, o trecho do livro que defende esse postulado é um dos bem poucos nos quais a argumentação do autor parece-me inteiramente ridícula, mesmo segundo seus próprios pressupostos". Eu não discordo do André quando ele diz que Meier "é, na maior parte do tempo, consistente com o melhor método histórico". Bem, na verdade, discordo quanto a ser o método de Meier o melhor disponível (voltarei a isso adiante); mas não nego que ele é um excelente historiador, nem que, via de regra, ele é coerente com seus critérios e postulados. Ocorre apenas que, nessa altura da crítica, eu estava justamente tratando das exceções a essa regra.
Feito esse esclarecimento, posso prosseguir tratando do método: Meier se insere na tradição liberal e secular de seguir o assim chamado método histórico-crítico. O comentário do André Luiz a respeito é deveras interessante, e hoje concordo com ele mais que há dois anos e meio. Digo isso porque, ao longo desse intervalo, adquiri uma visão mais nítida do papel das pressuposições externas à disciplina em questão - em especial as teológicas - que necessariamente estão por trás de qualquer esforço investigativo quanto às Escrituras, bem como a qualquer tema importante para o estabelecimento de uma cosmovisão. Essa mudança tem forte relação com o crescimento de minha inimizade contra o racionalismo, e também com várias leituras que andei fazendo, mas não farei aqui um relato biográfico acerca disso. O que importa assinalar é que concordo em grande parte com o que disse meu amigo: o método histórico-crítico não permite que se atinja o Jesus real, pois o Jesus histórico assim proposto "é construído por meio de uma disciplina racionalista, com métodos analítico-críticos, pressupostos metodológicos naturalistas etc.". Em outras palavras, existe uma teologia por trás dos pressupostos do método de Meier, e é essa teologia que impede que suas conclusões correspondam à verdade sobre seu objeto de investigação, de modo que é inelutavelmente furada sua pretensão de começar com uma investigação histórica imparcial para só depois, a partir dos resultados assim obtidos, construir uma teologia. O efeito prático obtido por essa proposta é apenas a de refinar e especificar uma teologia dentro de um leque pré-definido (e não muito amplo) de teologias possíveis, dados os parâmetros norteadores iniciais.
Ao dizer tudo isso, estou endossando de modo consciente alguns posicionamentos de pensadores calvinistas holandeses ligados a uma vertente pressuposicionalista, como Abraham Kuyper e Herman Dooyeweerd, para os quais toda cosmovisão e toda disciplina científica se fundam necessariamente em alguma teologia. Nesse sentido, estou também de acordo com o André quando ele diz que "A tentativa mesma de se procurar um 'Jesus Histórico' à parte do Cristo da Tradição implica em se criar outra história distinta da tradicional". Não que seja de todo impossível, em princípio, começar a investigação histórica sobre Jesus partindo de pressupostos naturalistas e então ser convencido a abandoná-los pelo peso da evidência. Na verdade, conheço vários casos assim, entre os quais talvez o mais notável seja o de Josh McDowell, mencionado por mim no post original. Se foi a intenção do André Luiz foi negar essa possibilidade, eu discordo dele, ainda que reconhecendo a interferência, nesse processo, de fatores alheios à investigação histórica em si. Entretanto, acredito que ele se referia, antes de tudo, às motivações subjacentes ao esforço investigativo, e nesse sentido estamos em pleno acordo. Afinal, como ele mesmo disse em outro trecho da mesma conversa, o próprio uso de um método histórico-crítico para construir um retrato do Jesus histórico só faz sentido se o Jesus apresentado nos evangelhos não puder ser aceito como real.
Tendo em vista tudo isso, dou razão ao meu amigo, ao mesmo tempo em que defendo a possibilidade de uma crítica objetiva a certas conclusões do próprio método histórico-crítico, e ainda mais ao método em si, pois sua grande fraqueza é justamente a pretensão de neutralidade e imparcialidade, que denunciei com particular ênfase na postagem anterior. Isso pode ser ilustrado com especial clareza por uma curta discussão que tive outro dia com um protestante liberal acerca dessa questão dos pressupostos. Ele poderia ter dito que os pressupostos da hermenêutica conservadora são incompatíveis com o conteúdo das Escrituras, e que o mesmo não acontece com a hermenêutica "moderna". Ou então ele poderia ter dito que ambos os conjuntos de pressupostos são alheios ao objeto de investigação, de modo que a escolha entre eles deve ser feita com base em outros critérios quaisquer. No entanto, aquele meu interlocutor preferiu começar dizendo que toda leitura leva de modo inescapável uma carga de pressupostos alheios ao texto, usando isso para acusar a teologia conservadora de circularidade, sem, no entanto, levar seu argumento às últimas consequências estendendo a mesma acusação à teologia liberal. Trata-se de uma parcialidade descarada que esse meu interlocutor não soube sequer disfarçar. John Paul Meier, munido de erudição incomparavelmente superior, foi capaz de introduzir seus pressupostos de maneira muito mais sutil e atraente, mas seu equívoco, no fim das contas, não é diferente. Embora o autor reconheça com humildade, já no início do livro, a dificuldade inerente à tentativa de ser objetivo, seu próprio conceito de objetividade é distorcido de antemão por seus pressupostos teológicos a um ponto que vai muito além de sua consciência.
Com tudo isso, espero ter esclarecido o que penso hoje sobre o trecho acima citado do comentário do meu amigo André Luiz. Ainda preciso dar atenção ao último trecho de seu comentário, e o texto presente proporcionará o substrato necessário para esse empreendimento, que pretendo levar a cabo numa postagem futura. Por enquanto, e a título de conclusão momentânea, direi que o método histórico-crítico, utilizado de modo amplo pela academia secular e pelos segmentos liberais das academias teológicas católicas e protestantes, não pode ser sustentado como a melhor abordagem hermenêutica aos evangelhos (ou às Escrituras em geral) sem a teologia que o justifica. Como não sou adepto dessa teologia, sou mais simpático ao método gramático-histórico, tradicionalmente adotado no meio teológico reformado conservador, de cuja existência é improvável que alguém chegue a tomar conhecimento lendo um autor como Meier. Uma demonstração adicional da tremenda parcialidade dos adeptos do primeiro método está justamente no fato de que não o apresentam como fundado em certos pressupostos filosóficos e teológicos, mas sim como "o melhor método histórico", o método por excelência, o único racional e científico, sem o qual não se pode conhecer o que quer que seja. Eu jamais diria coisa semelhante do método que prefiro, nem negaria utilidade ao método alternativo, e muito menos fingiria que ele não existe. Quem fala dessa maneira é fanático e intolerante, pouco importando que tente disfarçar isso mediante o uso ostensivo da palavra "modernidade".
Para que ninguém seja obrigado a ler ou reler meu texto original, embora isso seja recomendável, aqui vão algumas palavras acerca dele. O texto tem uma estrutura bem definida: feita a introdução ao assunto, destaquei as qualidades do autor e listei os principais méritos da obra. Depois disso, fiz-lhe várias críticas, começando pelo menos importante e progredindo em direção ao realmente importante. O fio comum a toda a crítica é a incoerência do autor. Os erros menos importantes residem na incoerência entre seus pressupostos e algumas de suas conclusões; os de importância intermediária, na incoerência interna dos próprios pressupostos; e os mais importantes estão na completa ausência de argumentação sobre pontos essenciais à validade de todo o empreendimento. Em todos os casos, citei alguns exemplos concretos que me pareceram deveras reveladores, mas o fiz em diferentes etapas do texto, a fim de deixar claro que não tencionava colocar todos esses erros no mesmo patamar.
Passei do elogio à crítica com as seguintes palavras: "Vejo também, entretanto, muito espaço para críticas, tanto a pontos específicos quanto à estrutura global e às próprias motivações da obra. O autor não deixa de cair na cilada do ceticismo excessivo em certos pontos, como ao negar a realidade histórica das narrativas sobre a infância de Cristo ou ao defender que o relato da concepção virginal de Jesus Cristo é fruto de uma tradição posterior, que não poderia de modo algum ter origem na própria mãe do Salvador." Acerca desse trecho, o André teceu o seguinte comentário:
"Rapaz, não é que ele caia em uma armadilha. Ele é, na maior parte do tempo, consistente com o melhor método histórico. Mas é esse método que sempre vai implicar uma distância, maior ou menor, entre uma biografia secular de Jesus e o que dizem os Evangelhos. A tentativa mesma de se procurar um 'Jesus Histórico' à parte do Cristo da Tradição implica em se criar outra história distinta da tradicional. Nesse sentido, Meier está correto: O Jesus Histórico jamais será o Jesus Real, pois o Jesus Histórico é construído por meio de uma disciplina racionalista, com métodos analítico-críticos, pressupostos metodológicos naturalistas etc. E neste sentido Bultmann está correto. Está correto porque 'se você parte dos princípios errados, sua conclusão também será errada', como disse Chesterton (cito de cabeça)."
Há várias questões interessantes aqui. A primeira decorre do que eu disse acima. Os exemplos que citei nesse trecho como reveladores de um "ceticismo excessivo", sendo os primeiros do post, pertencem à classe das conclusões que são discutíveis mesmo dentro do conjunto de pressupostos adotados por Meier. Não pretendo registrar agora as razões que me levaram a emitir tal juízo, inclusive porque li o livro há mais de dois anos e não o tenho em mãos, o que poderia me levar a cometer alguma imprecisão ou injustiça. Desejo, no momento, apenas esclarecer isto: ao dizer que Meier foi cético demais em seus juízos sobre a historicidade das narrativas da infância e da concepção virginal, sobretudo desta última, eu não estava me distanciando dos pressupostos do autor, e sim adotando-os para fins de argumentação. Com relação à concepção virginal, em especial, foi isso mesmo que eu disse na frase subsequente: "Aliás, o trecho do livro que defende esse postulado é um dos bem poucos nos quais a argumentação do autor parece-me inteiramente ridícula, mesmo segundo seus próprios pressupostos". Eu não discordo do André quando ele diz que Meier "é, na maior parte do tempo, consistente com o melhor método histórico". Bem, na verdade, discordo quanto a ser o método de Meier o melhor disponível (voltarei a isso adiante); mas não nego que ele é um excelente historiador, nem que, via de regra, ele é coerente com seus critérios e postulados. Ocorre apenas que, nessa altura da crítica, eu estava justamente tratando das exceções a essa regra.
Feito esse esclarecimento, posso prosseguir tratando do método: Meier se insere na tradição liberal e secular de seguir o assim chamado método histórico-crítico. O comentário do André Luiz a respeito é deveras interessante, e hoje concordo com ele mais que há dois anos e meio. Digo isso porque, ao longo desse intervalo, adquiri uma visão mais nítida do papel das pressuposições externas à disciplina em questão - em especial as teológicas - que necessariamente estão por trás de qualquer esforço investigativo quanto às Escrituras, bem como a qualquer tema importante para o estabelecimento de uma cosmovisão. Essa mudança tem forte relação com o crescimento de minha inimizade contra o racionalismo, e também com várias leituras que andei fazendo, mas não farei aqui um relato biográfico acerca disso. O que importa assinalar é que concordo em grande parte com o que disse meu amigo: o método histórico-crítico não permite que se atinja o Jesus real, pois o Jesus histórico assim proposto "é construído por meio de uma disciplina racionalista, com métodos analítico-críticos, pressupostos metodológicos naturalistas etc.". Em outras palavras, existe uma teologia por trás dos pressupostos do método de Meier, e é essa teologia que impede que suas conclusões correspondam à verdade sobre seu objeto de investigação, de modo que é inelutavelmente furada sua pretensão de começar com uma investigação histórica imparcial para só depois, a partir dos resultados assim obtidos, construir uma teologia. O efeito prático obtido por essa proposta é apenas a de refinar e especificar uma teologia dentro de um leque pré-definido (e não muito amplo) de teologias possíveis, dados os parâmetros norteadores iniciais.
Ao dizer tudo isso, estou endossando de modo consciente alguns posicionamentos de pensadores calvinistas holandeses ligados a uma vertente pressuposicionalista, como Abraham Kuyper e Herman Dooyeweerd, para os quais toda cosmovisão e toda disciplina científica se fundam necessariamente em alguma teologia. Nesse sentido, estou também de acordo com o André quando ele diz que "A tentativa mesma de se procurar um 'Jesus Histórico' à parte do Cristo da Tradição implica em se criar outra história distinta da tradicional". Não que seja de todo impossível, em princípio, começar a investigação histórica sobre Jesus partindo de pressupostos naturalistas e então ser convencido a abandoná-los pelo peso da evidência. Na verdade, conheço vários casos assim, entre os quais talvez o mais notável seja o de Josh McDowell, mencionado por mim no post original. Se foi a intenção do André Luiz foi negar essa possibilidade, eu discordo dele, ainda que reconhecendo a interferência, nesse processo, de fatores alheios à investigação histórica em si. Entretanto, acredito que ele se referia, antes de tudo, às motivações subjacentes ao esforço investigativo, e nesse sentido estamos em pleno acordo. Afinal, como ele mesmo disse em outro trecho da mesma conversa, o próprio uso de um método histórico-crítico para construir um retrato do Jesus histórico só faz sentido se o Jesus apresentado nos evangelhos não puder ser aceito como real.
Tendo em vista tudo isso, dou razão ao meu amigo, ao mesmo tempo em que defendo a possibilidade de uma crítica objetiva a certas conclusões do próprio método histórico-crítico, e ainda mais ao método em si, pois sua grande fraqueza é justamente a pretensão de neutralidade e imparcialidade, que denunciei com particular ênfase na postagem anterior. Isso pode ser ilustrado com especial clareza por uma curta discussão que tive outro dia com um protestante liberal acerca dessa questão dos pressupostos. Ele poderia ter dito que os pressupostos da hermenêutica conservadora são incompatíveis com o conteúdo das Escrituras, e que o mesmo não acontece com a hermenêutica "moderna". Ou então ele poderia ter dito que ambos os conjuntos de pressupostos são alheios ao objeto de investigação, de modo que a escolha entre eles deve ser feita com base em outros critérios quaisquer. No entanto, aquele meu interlocutor preferiu começar dizendo que toda leitura leva de modo inescapável uma carga de pressupostos alheios ao texto, usando isso para acusar a teologia conservadora de circularidade, sem, no entanto, levar seu argumento às últimas consequências estendendo a mesma acusação à teologia liberal. Trata-se de uma parcialidade descarada que esse meu interlocutor não soube sequer disfarçar. John Paul Meier, munido de erudição incomparavelmente superior, foi capaz de introduzir seus pressupostos de maneira muito mais sutil e atraente, mas seu equívoco, no fim das contas, não é diferente. Embora o autor reconheça com humildade, já no início do livro, a dificuldade inerente à tentativa de ser objetivo, seu próprio conceito de objetividade é distorcido de antemão por seus pressupostos teológicos a um ponto que vai muito além de sua consciência.
Com tudo isso, espero ter esclarecido o que penso hoje sobre o trecho acima citado do comentário do meu amigo André Luiz. Ainda preciso dar atenção ao último trecho de seu comentário, e o texto presente proporcionará o substrato necessário para esse empreendimento, que pretendo levar a cabo numa postagem futura. Por enquanto, e a título de conclusão momentânea, direi que o método histórico-crítico, utilizado de modo amplo pela academia secular e pelos segmentos liberais das academias teológicas católicas e protestantes, não pode ser sustentado como a melhor abordagem hermenêutica aos evangelhos (ou às Escrituras em geral) sem a teologia que o justifica. Como não sou adepto dessa teologia, sou mais simpático ao método gramático-histórico, tradicionalmente adotado no meio teológico reformado conservador, de cuja existência é improvável que alguém chegue a tomar conhecimento lendo um autor como Meier. Uma demonstração adicional da tremenda parcialidade dos adeptos do primeiro método está justamente no fato de que não o apresentam como fundado em certos pressupostos filosóficos e teológicos, mas sim como "o melhor método histórico", o método por excelência, o único racional e científico, sem o qual não se pode conhecer o que quer que seja. Eu jamais diria coisa semelhante do método que prefiro, nem negaria utilidade ao método alternativo, e muito menos fingiria que ele não existe. Quem fala dessa maneira é fanático e intolerante, pouco importando que tente disfarçar isso mediante o uso ostensivo da palavra "modernidade".
Um comentário:
Adorei esse texto. De fato, é tão estranho pensar no "Jesus histórico" quanto na "Norma histórica", no "André histórico". Para tentar compreender um personagem real através dos testemunhos deixados sobre ele, o racionalismo é o pior instrumento. Se esse personagem é Deus, então!... não dá nem pra começar!
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